No projeto contratado pelo Governo Brasileiro à FCO-Fundação Christiano Ottoni/UFMG, para desenvolvimento de um Curso Padrão em Qualidade e Produtividade, havia recursos para pesquisa e participação em cursos e seminários no exterior. Fomos aos Estados Unidos, o Prof. Carlos Bottrel e eu, para participar do Seminário do Prof. W. Edwards Deming, realizado em Dallas, em 1986.

Dr. Deming (1900-1993) foi um estatístico, professor, escritor consagrado e consultor americano. Trabalhou com Walter A. Shewhart (1891-1967), que é conhecido pelo desenvolvimento do controle estatístico de processos e precursor do ciclo PDCA. Shewhart, juntamente com Deming, Joseph Juran e Peter Drucker são os verdadeiros “gurus” da administração. Tudo que vem depois decorre deles.

Após a II Guerra Mundial, a partir de 1950, Dr. Deming participou do esforço de reconstrução do Japão, como assistente do Comando Supremo das Forças Aliadas. Pessoa muito afável, cativante, carismática, ensinou a altos executivos japoneses  métodos para melhoria da qualidade e da produtividade, principalmente métodos estatísticos. Também difundiu a executivos os seus 14 Princípios da Administração para a melhoria das empresas. Apesar de ser considerado um herói japonês, só foi reconhecido nos Estados Unidos nos últimos anos da sua vida.

O seminário  tinha a duração de 5 dias, de 2ª. a 6ª. feira, com aulas e exercícios e  imersão total. No quarto dia, já estávamos bastante cansados. Durante uma sessão de exercícios à noite, resolvemos da uma espairecida fora da sala. Enquanto relexávamos,  quem veio em nossa direção? Dr. Deming. Foi logo dizendo brincalhão que estávamos gazeteando, dando-nos um puxão de orelha. Dissemos que já tínhamos adiantado os exercícios. Quis saber de onde éramos. Dissemos que do Brasil e o nosso objetivo. Interessou-me no detalhe pelo nosso projeto e, no final da conversa, desejou-nos sucesso. Esperava ele que o assunto tivesse grande desenvolvimento no Brasil, diferentemente do que acontecera nos Estados Unidos, que só recentemente estava descobrindo a matéria. Isto após o grande sucesso japonês, que surpreendeu o mundo com produtos de alta qualidade e preços acessíveis. Ora, já havíamos tentado conversar com ele, sem sucesso. Estava sempre cercado por seus “guardas costas” que evitavam o assédio de participantes que talvez quisessem convidá-lo par algum evento em seus países. Qualquer contato tinha que ser feito por meio deles. Assim, pelo nosso providencial cansaço, tivemos a oportunidade de conversar descontraidamente com Dr. Deming por cerca de 20 minutos, sem interferência de seus “empresários”.

Dr. Deming, já com 86 anos, mostrava-se uma pessoa otimista, entusiasmada, motivadora, com muita esperança no futuro. Necessitávamos disso, tendo em vista os desafios que iríamos enfrentar. Todos sabem que não é fácil realizar coisas no Brasil. Não é atoa que o País ocupa um dos lugares mais privilegiados no topo do ranking dos países mais difíceis de fazer negócios. E na década de 80, era pior. Éramos isolados do mundo, com tantas barreiras protetoras. A situação melhorou um pouco com a 2ª. abertura dos portos feita pelo governo Collor( fato auspicioso a destacar no período!). Na verdade os desafios foram tantos que parece milagre o que atingimos. Foi produto de muita persistência, dedicação, idealismo. Hoje, a gestão empresarial é assunto muito desenvolvido no País, com grandes empresas competindo no mercado globalizado. E nossa contribuição foi marcante no processo.  Com relação ao Brasil, é lamentável que pouco seja feito para tornar o ambiente mais amigável para o desenvolvimento empresarial e de negócios.

Para mim o Seminário do Dr. Deming foi extremamente proveitoso. Além do aspecto motivacional, aprendi, além dos ensinamentos para administrar empresas, o ferramental para controle de processos de forma didática e lúdica.  De volta, revi ensinamentos de estatística ensinados no curso de engenharia e importei um kit do Japão (para fazer algumas simulações de controle de processos). Com esta bagagem, sem ser estatístico, ministrei  cursos, durante cinco anos, para executivos de grandes empresas, entre elas a antiga COSIPA e CSN, contribuindo efetivamente para divulgação e aplicação da matéria. Como o nosso projeto cresceu além das expectativas, tive que me dedicar a administrá-lo na FCO, além, é claro, das atribuições normais de professor em dedicação integral, não tendo mais condições de atuação nas empresas. Porém, incluí o conteúdo prático dos ensinamentos de Deming nas disciplinas regulares sob minha responsabilidade no curso de engenharia metalúrgica, sendo sempre recompensado pelo grande interesse dos alunos.